Como tornar conteúdos mais úteis para seus alunos e aumentar a aprendizagem
O modelo de Mudança Conceitual na estrutura cognitiva de uma pessoa é um interessante (e importante) conceito sobre a aprendizagem. Quero mostrar neste artigo, que, ao analisar o uso de documentários e outros tipos de vídeos de educacionais na rotina escolar, não é difícil perceber o quanto eles podem ajudar a promover mudança de status do conhecimento, ao tornar informações e conceitos mais úteis ao aluno e, em consequência, a aprendizagem mais efetiva.
A TEORIA DA MUDANÇA CONCEITUAL
O modelo de Mudança Conceitual foi apresentado em 1982, entre outros estudiosos da educação, por George J. Posner, Peter W. Hewson, especialistas em análise do currículo e no processo de ensino e aprendizagem de ciências, no artigo Accommodation of a scientific conception: Toward a theory of conceptual change (Acomodação de uma concepção científica: Rumo a uma teoria da mudança conceitual – em tradução livre).


Para iniciar esta análise, vamos definir a informação como um conjunto de dados que o estudante recebe e o conhecimento como a compreensão destes dados que ocorre na sua estrutura cognitiva. Logo, podemos considerar a informação como ponto de partida do aprendizado: ao ser agregada ao conhecimento existentes, muda conceitos estabelecidos.
Posner e Hewson e outros colaboradores se propuseram a descrever como os alunos reformulam e reorganizam seus conhecimentos ao receberam determinadas informações, processo que definem com mudança conceitual daquilo que sabem. Eles propuseram quatro condições para a mudança conceitual acontecer no aprendizado de ciências:
1) O aluno deve experimentar insatisfação com suas ideias, percebendo que se faz necessária uma nova concepção;
2) Para que seja estabelecida uma nova concepção, as informações que chegam ao aluno devem ser inteligíveis para que possam percebidas por ele;
3) Para que a nova concepção seja incorporada pelo aluno, ela deve parecer plausível. Ou seja, as informações que chegam devem agregar um mínimo de aplicação, como por exemplo, a solução de problemas;
4) Por fim, a nova concepção deve sugerir a possibilidade de ser proveitosa. Ou seja, as informações recebidas e incorporadas devem abrir as portas para novas descobertas.
UMA ADAPTAÇÃO AO MODELO
Parece simples (e até meio óbvio) depois de colocado em palavras por Posner e Hewson, mas para chegar a estes conceitos eles pesquisaram por muito tempo. No ano de 2003, o professor de química da Universidade Federal de Viçosa, Per Christian Braathen, adaptou o modelo, pensando na forma como os conteúdos chegam ao aluno nos níveis de inteligibilidade, plausibilidade e utilidade.

O professor Braathen, que fez seu PhD na Universidade de Wisconsin – Madison e trabalhou com o professor Hewson, simplificou e colocou modelo de uma forma intuitiva, na forma de status do conhecimento:
- Primeiro nível, da inteligibilidade: o aluno entende o que está sendo falado ou lido, literalmente, embora, por falta de conexão entre conceitos, possa não ter entendido de verdade.
- Segundo nível, da plausibilidade, a informação passa a fazer sentido: o aluno não apenas percebe o enunciado dela como também entende o seu significado.
- O status mais alto é o nível da utilidade: além de entender o significado, o aluno compreende também para que serve o que está aprendendo, quando conhecimento se torna muito mais significativo.
Braathen também sintetizou esquematicamente as mudanças nível de status que podem ocorrer, quando há mudança qualitativa dos conhecimentos, ou seja, um conhecimento que é apenas inteligível, poderá se tornar plausível e até útil, tornando-se mais significativo, como mostrado a seguir:

OS AUDIOVISUAIS E A UTILIDADE DA INFORMAÇÃO
Analisando o modelo de Mudança Conceitual, percebemos que as abordagens de situações reais ou, pelo menos, de simulações de situações reais, podem ser excelentes aliadas do professor em seu esforço para que os alunos percebam as aplicações que pode dar à informação que lhes é apresentada.
Provocados e engajados pela narrativa do vídeo a buscar novas concepções para suas ideias, os alunos recebem informações colocadas numa linguagem que eles conhecem bem e de forma que a compreensão fique facilitada. Adicionalmente, motivados pela percepção da utilidade daquela informação, os alunos ficam mais receptivos a ela, o que acaba determinando mais atenção às explicações apresentadas pelo professor e maior participação nas aulas.
Os vídeos educacionais de diferentes gêneros são grandes aliados neste processo:
- Os documentários, porque mostram fenômenos naturais e experimentos científicos filmados em situações reais;
- Os filmes de ficção, quando mostram simulações da realidade;
- E os programas educativos, quando apresentam demonstrações práticas.
Essa capacidade de informar da obra audiovisual, de colocar um conteúdo no contexto da vida real, fica patente quando buscamos na internet alguma informação e encontramos um vídeo: seja para aprender a consertar o chuveiro que está dando choque ou para conhecer uma receita de pão. Quando aprendemos em um vídeo demonstrativo que devemos fermentar a massa do pão mais de uma vez para que ele fique mais saboroso, passamos a fazer isso e o pão fica realmente melhor, é porque aprendemos de verdade.
É fundamental aqui destacar que a leitura foi importante na busca de informações sobre a preparação do pão. Mas quando assistimos um vídeo com uma demonstração bem feita, as informações deixaram de ser abstratas e a possibilidade de colocá-las em prática aumenta significativamente. Por isso, usando o modelo proposto por Posner e Hewsen, podemos dizer que:
1) Estávamos insatisfeitos com o conhecimento que tínhamos sobre a receita de pão: se fazia necessária uma nova concepção;
2) Na internet as informações que nos chegaram foram inteligíveis, permitindo que selecionássemos um ou mais vídeos;
3) Quando assistimos um bom vídeo, as informações nos pareceram plausíveis, ou seja, agregaram um mínimo de aplicação, com potencial de solução para o nosso problema;
(4) Por fim, graças às etapas anteriores, colocamos em prática as novas informações e percebemos que elas nos trouxeram uma nova e proveitosa concepção sobre como fazer pão. Fizemos novas descobertas, percebendo a possibilidade de variar as características do pão com diferentes estratégias de fermentação.
APLICAÇÕES NA ROTINA ESCOLAR
Na escola, entretanto, os vídeos nem sempre vão funcionar assim. Quem busca na internet um vídeo que ensina fazer pão ou mostra o conserto do chuveiro, tem um objetivo instrucional claro. Isso porque, para que seja efetivo na mudança conceitual, o vídeo deve estar contextualizado ao processo de aprendizagem proposto. Por isso, no ensino, na maior parte das vezes, não deve ser o aluno quem escolhe o vídeo a ser assistido na sala de aula ou fora dela (como um dever de casa), mas sim o professor, de acordo com a estratégia de abordagem que ele pretende fazer de um dado assunto.
Além disso, o vídeo será efetivo como apoio ao aprendizado se for inserido no contexto da abordagem do professor sobre um ou mais conteúdos. A obra audiovisual será um elemento adicional no processo de ensino/aprendizagem, assim como as informações passadas verbalmente, na forma de esquemas e ilustrações, demonstrações, leitura de textos, práticas no laboratório, etc.
Por fim, vale destacar, a escolha também deve considerar se o vídeo tem qualidade e se está adequado ao momento em que será inserido: se na introdução do tema, no aprofundamento da abordagem ou em sua conclusão.
Dessa forma, a obra audiovisual poderá ajudar a promover a mudança conceitual, tornado o conteúdo ministrado não apenas inteligível ou plausível, mas também útil ao aluno, o que tornará seus conhecimentos muito mais significativos.
RESUMO FINAL
Resumidamente, então, sobre vídeos e mudança conceitual podemos dizer que:
- Vídeos educacionais podem ser poderosas ferramentas para promover a Mudança Conceitual, um conceito de aprendizagem que envolve a reestruturação do conhecimento ao incorporar novas informações.
- De acordo com a teoria de Posner e Hewson, para que ocorra essa mudança, os alunos devem sentir insatisfação com suas ideias atuais, entender e achar plausíveis as novas informações, e perceber sua utilidade.
- Utilizando documentários, filmes de ficção e programas educativos, professores podem contextualizar conteúdos e demonstrar aplicações práticas, tornando o aprendizado mais significativo e efetivo.
- A escolha criteriosa de vídeos pelo professor, alinhada à estratégia de ensino, é crucial para maximizar seu impacto no processo de aprendizagem.
E você, o que acha da Teoria da Mudança Conceitual? Você usa vídeos para ajudar em suas atividades de ensino? Que tal experimentar? Deixe aqui seu comentário.
Saiba mais sobre o uso de audiovisuais na educação lendo o post MATERIAL DIDÁTICO: O FUTURO DA APRENDIZAGEM USANDO VÍDEOS NA SALA DE AULA.
Leia mais artigos sobre o tema na página: Vídeos e Aprendizagem.
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Bibliografia
BRAATHEN, P.C. O processo ensino aprendizagem em disciplinas básicas do terceiro grau. Educação e Tecnologia, v.8, n.1, 34-41, 2003. Disponível em: <https://periodicos.cefetmg.br/index.php/revista-et/article/view/53>. Acesso em: jun. 2024.
FELDER, R.M & BRENT, R. Ensino efetivo, uma oficina. Tradução Per Christian Braathen, Viçosa 1999.
NOVAK,J.D. & GOWIN,D.B. Learning how to learn. Cambridge University Press, Cambridge, 2012.
Posner, G., Strike, K., Hewson, P., & Gertzog, W. (1982). Accommodation of a scientific conception: Toward a theory of conceptual change. Science Education, 66, 211-227. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/sce.3730660207 – Acesso em: jun/2024.
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