A falta de letramento digital afeta alunos franceses (e certamente do Brasil e do mundo)
Segundo o Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (CEALE) da Faculdade de Educação da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), o termo “Letramento Digital” se refere à capacidade de uma pessoa de se comunicar nos ambientes digitais, fazendo coisas como trocar mensagens eletrônicas (via e-mail, sms, WhatsApp) e buscar informações na internet (encontrar textos, compreendê-los, selecionar as informações e avaliar sua credibilidade).
Quando pensamos em crianças e adolescentes que nasceram e foram criadas em meio ao uso intenso das mídias digitais, seria lógico pensar que eles dominam as tecnologias da informação e comunicação. No entanto, embora esta geração tenha “nascido com um celular nas mãos”, uma análise mais detalhada pode revelar que a boa parte dela, se não a maioria, está se tornando mera consumidora de mídias digitais por falta de um letramento digital adequado. É o que estão afirmando professores e pesquisadores franceses em entrevista ao jornal La Depeche, um diário regional de Toulouse, capital da província de Languedoc, na França.
Alunos não sabem usar o Word
Anne Cordier, professora de ciências da informação e da comunicação na Universidade de Lorraine e pesquisadora do Centro de Pesquisa em Mediações, afirma que a maioria dos alunos, embora usem o celular com avidez e aparentemente tenham grande intimidade com as tecnologias da informação, na verdade não dominam conhecimentos de informática considerados básicos. Anne Cordier associa esta lacuna à chegada do smartphone que revolucionou as comunicações abrindo as portas do mundo digital para a maioria das pessoas, para o bem e para o mal: “As competências que consideramos básicas como adultos que cresceram com computadores não o são para uma geração que nasceu com um smartphone nas mãos”.
Na mesma linha de pensamento, a professora de literatura e formadora em usos digitais em Paris, Cécile Cathelin, comenta na entrevista ao La Depeche que em turmas de 35 alunos, geralmente, apenas 2 ou 3 têm afinidade com computadores, ou seja, a maioria não sabe usá-los de verdade. Segundo ela os alunos não aprenderam a desempenhar tarefas simples como “abrir um documento Word, copiar um link ou copiar e colar” e que “quando recomendo que trabalhem em documentos compartilhados, eles não sabem do que estou falando.”
Celular x Computador: ferramentas muito diferentes
Yasmine Buono, especialista em educação digital e presidente da ONG Génération Connectée (Geração Conectada), faz uma afirmação interessante a o La Depeche: “Essa crença de que, por dominarem as redes sociais e os videogames, os alunos sabem usar o computador, é errônea. Eles fazem um uso recreativo da tecnologia digital, que deve ser diferenciado dos usos de escritório e profissionais”. A especialista completa este raciocínio dizendo que “quando eles são pequenos, damos a eles uma tela para assistir vídeos no YouTube. Quando ficam mais velhos, eles criam perfis no Snapchat ou no TikTok. Com estes usos, como poderiam adquirir conhecimentos de informática?”
Aumentando desigualdades sociais
Anne Cordier aponta também outro problema relacionado aos celulares que deveria preocupar os educadores e os gestores educacionais, o das desigualdades sociais. Segundo ela, os alunos das classes socioeconômicas mais baixas até têm acesso a um telefone celular, mas dificilmente terão um computador em casa, o que representa um problema. Isso porque como nos tempos atuais a integração social passa pelo smartphone e pelas redes sociais, os pais se esforçam para dar aos filhos um celular, mas dificilmente poderão comprar um computador, que custa muito mais caro. “Portanto, estas crianças nunca aprendem a digitar em um teclado. Tive alguns alunos que só descobriram o que era um mouse na escola”, conclui a pesquisadora
O letramento digital necessário
Como explicar que uma geração constantemente colada a uma tela possa se sentir desconfortável com computadores, incapaz de realizar tarefas consideradas básicas?
A solução apresentada pelas três especialistas é relativamente simples, pelo menos em termos de conceito: há necessidade de que os alunos recebam formação na área de tecnologias da informação, ou seja, recebam um “letramento digital”. Devem fazer parte do ensino noções básicas de ciência da computação, como fazer o melhor uso dos processadores de texto e dos programas gráficos, preparação de slides, salvar arquivos.
Também seria muito importante acrescentar a esta solução o letramento digital relacionado a análise crítica dos conteúdos. Todo o tempo crianças e adolescentes (e também os adultos) são bombardeados com iscas digitais que, com títulos sensacionalistas (fantasiosos ou mesmo mentirosos) e imagens apelativas, os encaminham para tipos de entretenimentos cada vez mais rasos em termos intelectuais, recheados de mentiras e até mesmo de conceitos perigosos (como muitos vídeos de desafios).
Existem um desequilíbrio no acesso a bons conteúdos na internet. Tanto em relação à quantidade como quanto a oferta. Até existem muitos conteúdos de qualidade disponíveis, mas os algoritmos, influenciados por fatores variados (particularmente o impulsionamento pago), acabam apresentando primeiro o material que pouco ou nada tem a contribuir para formação das pessoas. Faz-se necessário: mostrar aos alunos que existem bons conteúdos para informação e entretenimento, indicar onde estão e exercitar com eles o ato de buscá-los e usá-los rotineiramente.
Os links abaixo levam você às duas principais fontes de informações deste artigo:
https://www.ceale.fae.ufmg.br/glossarioceale/verbetes/letramento-digital
Você já teve esta impressão sobre a chamada Geração Alfa (nascidos a partir de 2010)? Os alunos da sua escola também são craques no celular, mas pouco habilidosos no computador? O letramento digital deveria fazer parte do currículo da educação básica? Deixe aqui seu comentário.
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